Ficha Técnica

Arte Tempo. [S.i.] : Rolim, 1988

Arte Tempo

“A literatura é a forma mais difícil ou problemática da arte porque o apelo do indizível se sente aprisionado na rede do dizível, o máximo ou irredutível de si, que é o absoluto de si, se sente limitado no redutível do que diz.” Vergílio Ferreira (Arte Tempo)

“ Toda a arte é uma concretização de um apelo confuso para que a beleza exista. Há uma voz que em nós fala e a obra em que se ouve. Diremos que a obra condensa e manifesta o que é em nós oculto e indistinto. O belo em arte é a sua formalização, a redução ao percetível, do impercetível dele. Todo o homem é artista na aspiração a que o seja. Por isso existem as artes rudimentares e sobretudo a possibilidade de se aderir à obra de outrem. O que esse outrem trouxe foi a expressão do que se não sabia exprimir e sobretudo que não sabíamos que sabíamos, porque toda a grande obra é uma revelação. E as formas de arte elementar são o modo sumário e segundo de se realizar uma aspiração. Só se aprende o que já se sabe – disse um dia. Só nos atinge realmente o que já tinha em nós o lugar da sua recetividade. Toda a obra de arte que nos entusiasma é a expressão de um encontro entre o que procurávamos e o que nela viemos a encontrar. É um encontro que pode ser súbito como pode ser o trabalhar lento de um mútuo reconhecimento, Como no amor. (…) Diremos sumariamente que a arte é a transcendência emocionada de tudo, ou seja a sua metafísica. É essa transcendência que se operar na simples contemplação do real, porque esse real é já então a configuração da arte. Porque uma flor que nos encanta ou um pôr de Sol que nos vislumbra são já virtualmente o que seriam reazliados em obra de arte, num quadro ou num poema. Ainda que não possamos imaginar essa realização.” Vergílio Ferreira (Arte Tempo)

“Passados quarenta anos, Vergílio Ferreira retoma um ensaio onde se interroga sobre a relação entre o ‘belo’ e o ‘atual’. A interrogação era, é, respondida com uma outra pergunta: o que é o belo? Num primeiro momento, a reflexão contempla no belo a vertente de historicidade. Esta aparece como incontornável dado que corresponde a diversas configurações do humano. Mas o humano guarda em si uma autenticidade original que se manifesta na arte. A autenticidade do humano, confirmada no sentimento estético, é por isso aquilo que permite a ligação da história ao sagrado, de que a arte é manifestação. À queda do homem no tempo corresponde uma degradação, uma espécie de condenação à interpretação de que a emoção condensada na obra de arte permite resgatá-lo, restituindo-o à intemporalidade de uma unidade primordial. É a partir desses pressupostos que a poesia, a arte, adquire uma prioridade ontológica em relação à filosofia. O mito da origem é, em Vergílio Ferreira, solidário de uma conceção da linguagem para a qual ‘toda a ideia é o resíduo de uma emoção que se esqueceu.’ (p.28)”