Signo Sinal

“Sou da raça dos inúteis, dos que inventam a vida por sobre a vida, dos que constroem o real para além de todo o real e esse real é que é, dos que sabem o que perdura para lá do que é mudável e passa, dos que traem a verdade, porque há outra verdade ainda e mais nenhuma depois dela, dos que fecham os olhos para ver, dos que conhecem a memória e a transfiguração e a sua pátria é essa, dos que um pouco esquecem o que acontece, para habitar o que disso sobra e fica, dos marginais, dos amorais – qual é a tua moralidade?”, Vergílio Ferreira (Signo Sinal)

“e a ordem dos homens ser o sinal visível de um signo invisível (…) e descobrirmos o incrível de nós e das coisas e ser tudo tão simples como um simples olhar aberto.”, Vergílio Ferreira (Signo Sinal)

“lembrarei, para reflexões futuras, um livro tão inesperado como Signo Sinal (1979), onde o tratamento grotesco da revolução de Abril se faz através da paródia (séria e cómica: ver, por exemplo, o discurso das três mulheres; o discurso da Muda, ainda por cima bêbeda; a invasão do mortos, e a referência às sessões na Assembleia), insistindo-se também nos efeitos de redundância, da concessão ao exagero e à deformação, sintomas de uma indiferenciação axiológica e não exatamente de conservadorismo político; o modo romanesco de Vergílio Ferreira permanece intacto (o enquadramento ficcional da praia e da aldeia, correspondentes a tempos diferentes, mas não simétricos, da narração, o evocativo e o fatual; a situação subjetiva do labirinto e a companhia do cão Teseu), mas personagens como a puta Carolina (mesmo tendo em conta que o obsceno é uma categoria emergente da obra do Autor a partir de Alegria breve) e, sobretudo, o Arquiteto, surpreendem”

“Porque Signo sinal alimenta-se de uma fascinação: a fascinação pela ordem imemorial que rege a vida da aldeia, essa ‘harmonia obscura e profunda dos seres e das coisas’ (p.47). As mais belas páginas deste romance são aquelas onde vem repousar a imagem intemporal dessa existência perdida: ‘Procuram no sítio das casas a memória do que lá ficou, dos deuses e da sua ordem com que se organizava a vida e ela tinha sentido e era verdade, da tranquilidade do sono à noite quando o dia se cumprira.’ (p. 54) Esta imagem é tanto mais exaltante quanto a ela se vem contrapor a multiplicidade incontrolada do presente pós-terramoto e pós-revolução: é a desordem instalada no inferno das ideologias e no alarido tempestuoso das opiniões, é a ramificação de cada coisa no seu contrário e no contrário do seu contrário, é a bifurcação demente de todas as evidências em verdades e contraverdades sem prova nem acalmia. Na ordem primitiva, os nomes ajustavam-se às coisas, os homens tinham a vida centrada numa signnificação, os deuses davam sinais através das mais humildes coisas terrestres: é o mistério da sagração, antiquíssimo, inscrito no bolo da Páscoa que a criada leva sobre uma bandeja pelo corredor.”,

Ficha Técnica

Signo Sinal, Bertrand,  Amadora, 1979