Carta ao Futuro

“Meu amigo:

Escrevo-te para daqui a um século, cinco séculos, para daqui a mil anos… É quase certo que esta carta te não chegará às mãos ou que, chegando, a não lerás. Pouco importa. Escrevo pelo prazer de comunicar. Mas se sempre estimei a epistolografia, é porque é ela a forma de comunicação mais direta que suporta uma larga margem de silêncio; porque ela é a forma mais concreta de diálogo que não anula inteiramente o monólogo.” (Vergílio Ferreira, Carta ao Futuro)

“O fascinante milagre que é o sabermo-nos vivos, o conhecermos esta incrível iluminação de nós a nós próprios, de nós ao universo, só agora nos perturba, só agora é alucinante, porque só agora é gratuita. Vivemos em nós; a dimensão de infinitude que nos habita, este poder incrível de saber-nos, de sermos uma pessoa, é em nós que se limita e torna espessamente absurdo o desafio que nos lança a contingência e a morte.” (Vergílio Ferreira, Carta ao Futuro)

“Num momento em que a questão do futuro não era uma questão neutra, mas era a questão de uma utopia proposta aos homens, aos da sua geração, na qual as contradições humanas, o espetáculo da alienação que constitui a própria história humana e sobretudo aquela que era representada pela sociedade burguesa então em crise, ou assim parecia, decide Vergílio Ferreira endereçar ao futuro a sua famosa Carta, na qual praticamente todos os tópicos da sua visão das coisas estão já presentes. A ficção futura irá dar corpo ficcional àquilo que aqui é uma mistura entre o conceptual e o ficcional.”,

“Nesse texto Vergílio Ferreira endereça-se ao futuro, mas o destinatário é um destinatário mítico: só há um destinatário, que é ele próprio, admitindo a possibilidade desse tempo futuro em que tudo seja diferente, em que finalmente os istérios, ou as contradições, que nos rodeiam, sejam solucionadas.”,

Ficha Técnica

Ferreira, Vergílio, 1916-1996
PUBLICAÇÃO:
Separata 180/181 Revista Vértice, 1958
CDU: 821.134.3-6