Cerca de duas dezenas de estudantes da Universidade de Salamanca, acompanhados pelos Professores Paula Cristina Isidoro e Hugo Milhanas Machado, estiveram em Melo e em Gouveia, no passado mês de abril, para conhecerem uma parte do Roteiro Literário Vergiliano e a Sala Vergílio Ferreira da Biblioteca Municipal. Todos receberam um exemplar do Roteiro Literário Vergiliano – Melo e a ‘aldeia eterna’ de Vergílio Ferreira, editado pelo Município de Gouveia, de forma a seguirem os seus vários “capítulos” nos locais do chamado percurso urbano que começa e termina, numa circularidade tão do agrado da construção romanesca do autor, no Chão do Paço e na Casa Amarela.

Os alunos usufruíram, assim, da oportunidade de observar os lugares da “aldeia eterna” e apreender as histórias das suas gentes que inspiraram e moldaram o imaginário de Para Sempre – que alguns estudantes já tinham lido por indicação da Professora Paula Isidoro –, bem como de praticamente todos os romances de Vergílio Ferreira. Romance lírico ou romance-poema, Para Sempre é considerado, por muitos, o melhor livro de Vergílio Ferreira. É também, em conjunto com Manhã Submersa, o mais autobiográfico da sua vasta bibliografia.

De acordo com as palavras do Presidente do Município de Gouveia, o “Roteiro tem como referência o lugar da infância do autor, esse lugar que descreveu, com poucas alterações, nos seus quadros narrativos e no diário. Deste modo, ao contemplar os lugares, monumentos, casas e paisagens de Melo, onde se movimentam muitos dos protagonistas e personagens da ficção do autor de Manhã Submersa, o público que percorrer os caminhos da escrita vergiliana terá oportunidade de respirar uma atmosfera idêntica à que o autor captou para os seus romances e contos.” Ora foi precisamente essa atmosfera da escrita de Vergílio Ferreira que os Professores Paula Cristina Isidoro e Hugo Milhanas Machado proporcionaram aos seus alunos na deslocação a Melo e Gouveia.

O escritor nascido em Melo, além de grande apreciador de Cervantes, Unamuno e Ortega y Gasset, entre outros escritores e pensadores espanhóis, esteve algumas ocasiões em Salamanca, onde fez amizade com Angel Marcos de Dios, José Gavilanes Laso e Perfecto Cuadrado. Da Universidade de Salamanca saíram, aliás, duas teses de doutoramento sobre a sua obra literária, mais tarde publicadas com os títulos Vergílio Ferreira –  Espaço Simbólico e Metafísico de José Gavilanes Laso (1989) e O Discurso de Vergílio Ferreira como Questionação de Deus de Maria Joaquina Nobre Júlio (1996). Recentemente Isabel Soler, tradutora de várias obras de Vergílio Ferreira para a língua de Cervantes, referiu ter recebido um telefonema do poeta catalão, Joan Margarit, que após terminar a leitura de Em Nome da Terra do escritor português pretendia conhecer outras traduções da sua obra. E conclui Isabel Soler: “Mantivemos uma longa conversa e desliguei com um sorriso, porque já sabia que um poeta como Joan Margarit, intensamente sóbrio e muito eticamente valente, tinha de se encontrar com Vergílio Ferreira”.

Desde a inauguração do Roteiro Literário Vergiliano, em agosto de 2016, pelo Presidente da República, inúmeros grupos de leitores e admiradores da obra literária de Vergílio Ferreira já percorreram os seus vários locais, devidamente sinalizados em Melo, e descobriram a Sala Vergílio Ferreira da Biblioteca de Gouveia, como sucedeu agora com os estudantes dos cursos de Filologia Espanhola, Inglesa, Alemã e Francesa, que escolheram o português como segunda língua, e de Estudos Portugueses e Brasileiros da Universidade de Salamanca.

O Roteiro Literário Vergiliano e, sobretudo, a recente aquisição, por parte do Município de Gouveia, da casa amarela (Vila Josephine), em Melo – cuja cerimónia de assinatura do contrato de aquisição ocorreu, em 28 de janeiro passado, aquando do encerramento das Comemorações do Centenário de Nascimento do escritor – continuarão a proporcionar, no futuro, outros e fascinantes encontros de docentes, alunos, leitores e admiradores, portugueses e estrangeiros, com a vasta obra literária do autor de Até ao Fim. Muito em breve, aliás, a Vila Josephine – que serviu de modelo para a construção ficcional da casa de Para Sempre e da sua continuação epistolar, Cartas a Sandra, afinal uma das mais míticas habitações da literatura de língua portuguesa das últimas décadas – irá transmudar-se numa casa habitada pela “celebração da palavra” (Fernanda Irene Fonseca) e pelo imaginário vergilianos.